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24/03/2017 às 09:33, Atualizado em 23/03/2017 às 21:52

Seis anos depois de escândalo no Ibama, servidor ganha indenização por assédio

Justiça mandou pagar R$ 10 mil.

Alexandre Justino foi peça chave da Operação Caiman, deflagrada em outubro de 2011 pela Polícia Federal, e que derrubou o então suduperintendente do Ibama-MS (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Renováveis) em Mato Grosso do Sul, David Lourenço. Desde 2010, no entanto, Alexandre relata sofrer assédio moral e perseguição dentro do órgão.

Ele ingressou na Justiça Federal, pedindo que fosse reincluído em uma portaria que designa o cargo de agente de fiscalização, do qual foi retirado em 2010, à pedido da Superintendência. Além disso, pediu R$ 10 mil de indenização por danos morais. No dia 23 de fevereiro, Alexandre conseguiu sentença favorável e o Ibama terá que pagar os valores, corrigidos, ao trabalhador. Ainda assim, ele relata que não mudou e continua a ser submetido à mesma 'condição humilhante' na função administrativa que hoje ocupa.

A PF investigou delitos de venda, exposição, manutenção em cativeiro, depósito ilegal e transporte irregular de espécimes da fauna silvestre nativa do pantanal, notadamente do jacaré. O nome da apuração era uma alusão à forma como os animais são conhecidos na região, Caiman. De acordo com a corporação, no transcorrer das investigações, “restou evidenciada a participação de servidores públicos, notadamente do Ibama” na cadeia delituosa.

A investigação apontou irregularidades na criação de jacarés e na pousada pertencente ao médico veterinário e funcionário aposentado do Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Renováveis) Gerson Zahdi Bueno, 64. Apontado como beneficiante do esquema, o então superintendente deixou o cargo.

Denúncias

Em 2010, Alexandre e outro servidor começaram a realizar uma série de denúncias sobre a rotina de trabalho, o que envolvia o Superintendente à época, David Lourenço, como o uso do carro oficial para fins particulares e desvio de função de trabalhadores terceirizados. "Levava sal para fazenda em Rio Brilhante, levava os filhos a escola", cita, no processo. As denúncias foram encaminhadas para o MPE (Ministério Público Estadual), após Alexandre tomar conhecimento de que a Promotoria de Rio Brilhante solicitou informações sobre a fiscalização do Ibama na cidade.

"Eu sou servidor há 33 anos. Meu cargo, hoje, é técnico ambiental. O que aconteceu, quando houve as irregularidades no Ibama, da operação Caiman e uso de veículo oficial e de terceirizadas contratados para prestar serviço no Ibama. Quem começou a praticar esse assédio moral contra a minha pessoa foi o senhor David Lourenço, ex-superinterndente do Ibama", contou ele.

No dia 15 de junho de 2010, David Lourenço solicitou a presidência do Ibama-DF o afastamento de Alexandre do cargo de agente de fiscalização, e a retirada do nome de Alexandre da Portaria n. 1.273/98-P, que designa a função. No dia 21 de junho de 2010 foi publicada no boletim de serviço nº 06/2010, a exclusão de Alexandre da portaria.

Alexandre alega que o ato administrativo foi uma represália da Superintendência e que ocorreu de forma arbitrária. Ele cita o RIF (Regulamento Interno de Fiscalização) e afirma que uma alteração desse tipo deveria ser justificada por algum motivo.

Portaria que excluiu Alexandre da função de agente fiscalizador (reprodução)Portaria que excluiu Alexandre da função de agente fiscalizador (reprodução)

Perseguições

Alexandre foi remanejado para o Dipam (Divisão de proteção ambiental), em função administrativa. Ali, conforme relatou no processo, foi submetido a condições humilhantes além de desgaste físico e psicológico, que o fizeram procurar auxílio médico. "Ele acabou desenvolvendo problemas de saúde, estando hoje sobre acompanhamento médico. Estava em sala muito pequena, com móveis inadequados à sua estrutura física. Pediu móveis, pois estava sentindo muita dor muscular", conta a defesa no processo. Convites para participar de treinamentos técnicos também foram negados pelo chefe da divisão, de acordo com ele.

"As perseguições foram de todo jeito, me colocaram em uma sala, me tiraram das funções, eu fiquei sem saber o que fazer, não me deixavam viajar. Eu sou técnico ambiental e estava na portaria de fiscalização, existia deficiência de fiscais, ele agiu com desvio de finalidade, não foi a finalidade pública, tanto é que ele tentou colocar a gente à disposição do TRE, para afastar a gente da Superintendência", complementa Alexandre.

As denúncias e pedidos para o Ibama instaurar processo administrativo foi seguida por uma correição, do procurador-chefe do Ibama, Marcos Guimarães. A correição, realizada durante 7 dias na Superintendência, culminou em um relatório que negava todas as alegações de Alexandre e ainda pedia que ele e outros servidores fossem, ao final, encaminhados para "atendimento psiquiátrico".

Sobre o uso irregular de diárias em viagens oficiais, por exemplo, o procurador afirmou que "esta estratégia foi adotada pelos denunciantes para fazer parecer um universo potencialmnete maior do que na realidade era mera prestidigitação, um show de ilusionismo (...) Era devaneio e incúria dos denunciantes".

O procurador também acusou ele e outro servidor de beneficiarem-se do uso irregular das vagas dos carros do Ibama. Ainda relata, no documento que outros funcionários alegaram que o serviço de Alexandre "era ruim" e que "recebeu reclamações sobre o comportamento dele".

A defesa do Ibama argumentou, no processo, que "as alegações do autor não devem prosperar por falta de provas. É de concluir que a atividade de fiscalização não é função específica do técnico ambiental e sim uma mera indicação. A partir da lei nº 10.410/02 reservou-se ao analista ambiental a função do exercício do poder de polícia ambierntal inerente ao Ibama, passando a mesma a ser compartilhada com as técnicas ambientais para tanto são designadas através da portaria. Assim, é provisória a função de fiscalização para o técnico ambiental, pois somente tem autonomia para fazê-lo quando designado pela autoridade superior competente. Acabamos a missão, revoga-se a portaria em qualquer momento".

"O autor tem por objetivo o enriquecimento ilícito quando tenta convencer de que foi vítima de dano moral", afirmou.

Assédio moral

A juíza Janete Lima Miguel, da 4ª Vara Federal de Campo Grande, não concordou com o pedido de tutela antecipada para que Alexandre fosse reincluído no cargo que pediu. Ainda assim, para ela, o trabalhador foi submetido a condições de assédio moral.

"O assédio é um processo, um conjunto de atos de natureza psicológica que se destinam a expor a vítima a situações humilhantes e vexatórias, sendo irrelevante para a sua configuração o tipo de procedimento adotado pelo agressor. O que importa, em primeiro lugar, é a modalidade da conduta: agressiva e vexatória, capaz de constranger a vítima, provocando-lhe sentimentos de humilhação e inferiorização", citou ela.

"É que não é raro acontecer, por exemplo, a transferência de um servidor público para algum setor ou para outra localidade, apenas por capricho da autoridade administrativa ou, de uma forma mais grave, com desvio de finalidade, motivada por vingança ou perseguição. No presente caso, restaram comprovados os elementos caracterizadores do assédio moral.O autor, ocupante do cargo de Técnico Ambiental, foi designado pela Portaria n. 515/2002 para atuar na área da fiscalização ambiental", complementou.

A magistrada ainda elogiou Alexandre, que, conforme explicou na sentença, sofreu assédio por cumprir com o dever ao denunicar as irregularidades. "Tais fatos resultaram comprovados pelos depoimentos do autor e das testemunhas ouvidas nestes autos.Releva afirmar que todas esses constrangimentos sofridos pelo autor ocorreram, só porque ele fez denúncias de irregularidades que estariam acontecendo no órgão em que trabalha. Essa atitude do autor, de requerer apuração de supostas ilegalidades na Administração Pública, deveria merecer elogio, e não reprimenda ou perseguição para o mesmo".

O Jornal Midiamax solicitou um posicionamento para a assessoria de imprensa do Ibama, mas até a conclusão da matéria, não obteve resposta. O ex-superintendente Davi Lourenço, que não é parte do processo, mas é citado como responsável por parte das perseguições ao servidor, foi procurado pela reportagem. Por telefone, ele disse que só pode se manifestar no fim desta tarde.

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